Do maniqueísmo e das decepções
Sempre pensei certo ou não, que uma decepção tem dois lados: o lado da tristeza, da perda de referência, do abandono e o outro lado, o da busca de novos paradigmas – caminhos e a construção de novas perguntas. Como em geral, registramos o sentimento de dor, ninguém gosta de se decepcionar. O ideal é que tivéssemos um ‘’pára raio’’ contra isso, mas como não temos sugiro que olhemos para estes momentos de forma mais tranqüila e se possível, até com certo otimismo. É o que faço com esse ‘’tal’’ de teatro.
Porto Alegre em Cena
Em dois anos tive três decepções com os espetáculos que assisti no Porto Alegre em Cena (uma das mais importantes mostras de teatro no Brasil), duas que considero grande e uma média. As duas grandes foram com os espetáculos: ‘’Para as crianças de ontem, hoje e amanhã’’ de Pina Bausch (Alemanha) e ‘’O Grande Inquisidor’’ de Peter Brook (Inglaterra). A decepção média foi com o espetáculo ‘’Les Éphémères’’ de Ariane Mnouchkine (França). Considero Pina Baush uma das principais encenadoras contemporâneas, seus espetáculos principalmente aqueles construídos na década de 1980 (como Café Muller, por exemplo), foram fundamentais – contribuíram para uma profunda reflexão sobre as artes cênicas, aliás, a expressão Teatrodança, surge a partir de suas montagens. Sem dúvida, Pina ainda é fundamental, porém a peça que ela trouxe no Porto Alegre em Cena do ano passado foi decepcionante, coisa ruim mesmo. Com uma marcação linear/pobre, com uma trilha cansativa, com atores de gestualidade viciada e com um cenário absurdamente medíocre – era triste de ver.
Outra grande porcaria foi ‘’O Grande Inquisidor’’ de Peter Brook, apresentado este ano. Brook também é um diretor reconhecido, sempre montou ótimos espetáculos (como Le costume, por exemplo) e por isso, assistir o Inquisidor foi muito dolorido. Pode-se dizer que a peça era um monólogo de dois atores, um que ficou o tempo inteiro parado e outro que só sabia despejar o texto - uma bosta que nem para entretenimento serviu.
Já o espetáculo ‘’Les Éphémères’’ de Ariane, de média decepção, atingiu os objetivos da encenadora e seguiu dentro de sua proposta. Ariane, ao contrário de Pina e seguindo a mesma linha de Brook, sempre navegou pelo conhecido ‘’Teatrão’’, toscamente falando são encenações que descartam o experimentalismo e que seguem uma proposta de maior comprometimento com a dramaturgia em detrimento ao trabalho físico do ator. O espetáculo era bonito, bem dirigido, os atores tinham ritmo, o cenário e a trilha eram ótimos, mas era só isso, ou seja, não apresentou nada de novo, não fez o público refletir, me senti como se estivesse vendo uma novela bem feita.
Então
Frustrei-me, fiquei chateado e dei razão a quem saiu das apresentações gritando, mas permaneci imóvel. Como eu poderia ofender meus ‘’ídolos’’? Mais tarde, ainda de ressaca, agradeci por estes momentos de grande tristeza - vi o lado bom da coisa. No fundo estas decepções contribuíram para fortalecer a idéia que o ‘’tal teatro’’ se esgotou. Lugar de novela é na tv e, teatro e literatura é um casamento fadado ao fracasso. Aliás, isto nos leva a um paradoxo: o teatro para se modernizar deve voltar ao passado? Penso que sim, chega deste teatrinho de fim de semana, basta desta bobagem vazia que reproduz esta medíocre linguagem ‘’telenovelística’’. Este teatro não é mais imprescindível em nossa sociedade, afinal já temos a tv e o computador. Neste caso vejo somente duas saídas: ou matamos de vez o teatro da palavra e ressuscitamos o ator ou deixamos o teatro seguir seu rumo e inventamos uma nova manifestação artística, onde o centro da coisa seja a transformação e a cura (como dizia Artaud), uma arte agradável e ao mesmo tempo profunda, onde os sentidos sejam os elos da comunicação.
Viu como frustração não é só dor, é também utopia?
Dica
Já que falei de teatro, sugiro que vocês assistam ao filme ‘’Adeus Minha Concubina’’ de Kaige Chen. No filme, além da bela fotografia e do enredo envolvente, é possível observarmos o processo e treinamento dos atores do Teatro de Ópera de Pequim. Muito bom!
Claiton Manfro
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