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domingo, 25 de julho de 2010

A Construção da Percepção no Teatro

Pode-se afirmar que a principal função do diretor de teatro é o ato de perceber. Se o cenário e o figurino estão adequados à proposta estética do espetáculo; se a trilha sonora não contradiz a idéia do texto (entendido aqui como qualquer tipo de manifestação ideológica, não necessariamente um pedaço de papel com frases escritas); se o texto está, de fato, apreendido pelos atores; se a iluminação (cores, focos, etc) está de acordo com os objetivos das cenas; se existe precisão na movimentação cênica e, por fim, perceber se as ações físicas dos atores estão transmitindo a idéia do espetáculo – se a representação física é verdadeira.
É lógico que o papel do diretor, na montagem de uma peça, seja ela de rua, palco italiano, arena, sala ou galpão, não se restringe a perceber as coisas – a percepção. O diretor faz a colheita e transforma a matéria prima (trabalho dos atores) em produto, ou seja, em espetáculo. Sei que as questões colocadas até o momento fazem parte da compreensão básica, banal e óbvia acerca do tema, no entanto, pretendo chamar a atenção para uma delas: A percepção sobre as ações físicas. Destaco este item por considerar a constituição do olhar no trabalho teatral o mais difícil, confuso e, ao mesmo tempo, rico e compensador. Quero justificar minha chatice afirmando que provavelmente existem livros, embora nunca tive acesso a eles, que abordem o assunto e isto, certamente, torna as reflexões expostas neste artigo frutos de um pequeno desespero pessoal.
Para expor estas reflexões, optei por fazer algumas considerações, parte de uma concepção individual, tais como: Considerando que os princípios fundamentais do teatro são a transformação da vida e a busca permanente da verdade; que o papel do diretor é servir de instrumento estimulador dos atores na procura destes princípios ou seja, o diretor visto como semeador de dúvidas; que o processo – meio da montagem de um espetáculo é mais importante que o próprio espetáculo – fim; que a visão geral sobre o teatro é medíocre, pois reduz o ato teatral ao espetáculo, ao entretenimento e ao mercado de consumo dos bens culturais, visão que se restringe ao público – platéia, muitos diretores e atores pensam desta forma e, considerando ainda, que tanto os atores quanto os diretores pertencem à espécie humana “normal” e portanto são, de igual forma, pessoas – produtos que refletem esta sociedade hipócrita, discriminadora e preconceituosa em que vivemos. Como podem, então, os diretores e atores construírem este olhar, teoricamente distanciado de sua natureza humana e tão importante na busca dos princípios do teatro? Como fazer para sublimarem suas crises existenciais e os problemas pessoais impostos pelo cotidiano no momento de entrarem em trabalho e de construírem um novo estado energético, essenciais para a atuação cênica? Como se consegue olhar para dentro – entrar para dentro (neste caso um pleonasmo vicioso justificado) sem cair num psiquismo exagerado, com seus complexos e vícios?
Penso que as respostas para essas questões etão diretamente relacionadas à forma, ao jeito de ver – olhar as coisas. Ao como se percebe a dinâmica da vida e aquilo que optamos em colocar sob foco. A forma, o como e o foco utilizados num processo ou método de trabalho são inerentes e refletem a formação cultural e ideológica de cada pessoa. Em outras palavras, a construção da percepção nada mais é que a consciência do caos pessoal e social. A reflexão sobre nossas atitudes e fatos ocorridos em nosso cotidiano.
O problema é a dor que esta busca causa, ninguém gosta de reconhecer seus limites, é mais seguro fechar os olhos, fingir que não ouve. É lógico que existem aqueles que enfrentam o desafio e abrem-se para a possibilidade da surpresa, porém geralmente fazem isso dentro de um nível de controle que bloqueia o acesso a verdade, aliás, raramente chega-se nela. Talvez, Iben Nagel Rasmussen, do Odin Teatret (Holstebro) e Ryszard Cieslak do Teatr Laboratorium (Wroclaw) – atores e Grotowski e Barba – diretores, chegaram neste tipo de teatro, em espetáculos como Ksiaze Niezlomny e as cinzas de Brecht, respectivamente. Tanto no trabalho do ator, quanto no trabalho do diretor, o ato de reconhecer-se e conhecer o mundo que nos cerca é o primeiro passo para se chegar a um resultado comprometido com os princípios citados anteriormente. O caos é fundamental para que a verdade possa emergir.
Por fim tenho que dizer que acredito na tal memória do corpo; nos impulsos energéticos; na utilização dos sentidos como meio de comunicação; na retenção de energia como suporte na precisão das ações; na força de oposição física; na pré-expressividade; na dilatação corpórea e que vejo na descoberta das possibilidades e potencialidades do corpo (visto dentro de um conceito oriental, onde corpo é igual a mente, voz e espírito) aliados a humildade e generosidade, o principal caminho a ser trilhado por aqueles que vêem o teatro e dança, além do simples reconhecimento social.

Claiton Manfro Schinoff
Diretor e pesquisador de Teatro/Dança
Revista Evidência - Agosto/2001

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