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quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Leia com os olhos fechados II

Leia com os olhos fechados 2

Libertei os pés dos sapatos e caminhei sobre os pedregulhos e a grama. Ainda chovia um pouco, e os pingos que caíam lentamente do chapéu, davam estética xadrez à paisagem. Deu vontade de correr, não para exercitar, mas pra sentir isso tudo.

A chuva guasqueada e o cheiro da terra molhada, emprestavam razão aos sentidos e, pra ajudar, tinha uma trilha sonora que era carregada de acordes. Era um som de silêncio – de reencontro. Queria que vocês vissem, parecia um desenho do Berega(1), carregado de detalhes e emoções.

Percebi que em cada folha caída das árvores, que em cada moirão de cerca, também me percebia - eu estava ali, eu era tudo. Então, entendi o sentido de pertencimento e permanência. Mais ainda, entendi que a solidão não passa de um descuido de visão.

Continuei caminhando. Peguei a trilha que dava na porteira dos fundos e fui até o velho pé de corticeira. Os ninhos de passarinhos e as barbas de pau, enfeitavam as árvores e rendiam ar de imponência à copa.

Bah, que coisa mais linda!

A chuva alegrava a passarinhada, embelezava a beleza e aguçava a filosofação: Platão que me desculpe, a beleza não precisa de ninguém, ela existe por si só.

Essa história toda me lembrou de um tempo antigo, em que os olhos destreinados de sensibilidade, buscavam consolo nos colos maternos. É isso mesmo, lembrei da infância e, com isso veio um pouco de tristeza, pois, apesar das boas lembranças dessa época, vivia, como todas as crianças, isolado da consciência.

Não sabia, por exemplo, que aquele cheiro de galpão (que eu tanto gostava), era resultado da soma de outros aromas: tinha o perfume das costaneiras de eucalipto, do óleo do trator, dos arreios, da fumaça do fogão campeiro e dos ninhos que as corruíras faziam nos caibros.

Se naquela época, eu soubesse que na vida, tudo não passa de uma soma, faria arte das acrescentações e inventaria até um jeito de pensar.

Por exemplo: não brigaria mais para buscar os terneiros no descampado, porque saberia que os descampados são povoados de pequenos povos. Daria, apesar do frio, mais valor aos banhos de açude tomados no inverno, porque saberia que esse instante de frio, guarda um raro período de alegria e liberdade. Aproveitaria mais as geadas nos campos e tomaria mais água das cacimbas, porque entenderia que essas coisas nos aproximam de Deus. Apreciaria mais os bandos de pássaros que se deslocam para repousar nos finais de tarde, porque saberia que se deslocando daquele jeito, os pássaros (seres livres) nos ensinam que a vida, também é feita de disciplina.



Dica: Leia o livro “Solo de Clarineta” de Érico Veríssimo. 

Claiton Manfro

[1] Luiz Berega: baita artista plástico de nosso Estado. Ilustrou nos anos de 1980, os calendários dos postos Ipiranga.

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